O Iepé promoveu, entre os dias 22 e 24 de novembro de 2011, na cidade de Oiapoque, o Quarto Encontro Transfronteiriço dos Povos Indígenas do Brasil, da Guiana Francesa e do Suriname. Além de membros de órgãos governamentais e de organizações não governamentais dos três países, todos os 12 povos indígenas que habitam essa região estavam representados, totalizando mais de 160 participantes.
O evento deu seqüência à série de encontros transfronteiriços, que foram realizados em Macapá (Brasil, 2008), Saint-Georges de l’Oyapock (Guiana Francesa, 2009) e Galibi (Suriname, 2010) como parte da proposta de articulação indígena transfronteiriça do Planalto das Guianas. Mais uma vez, o evento propiciou o encontro de índios de diversos povos que raramente têm a oportunidade de se reunir, constituindo um rico espaço de trocas de experiências e debates. A partir da discussão de quatro temas- Representatividade política e governança dos povos indígenas; Questões fundiárias e gestão territorial e ambiental; Desafios socioambientais no Planalto das Guianas e Gestão do patrimônio cultural e educação intercultural- os participantes indígenas puderam conhecer diferentes realidades, reconhecer desafios comuns e buscar estratégias em conjunto para superar problemas que afetam os povos indígenas da região e as florestas onde vivem.
Temáticas principais – A representatividade política dos povos indígenas, o reconhecimento dos direitos territoriais indígenas e a gestão das terras foram temas focalizados durante o encontro cujos debates tiveram grande repercussão entre os participantes
Quanto à representatividade política dos povos indígenas, foram enfatizados pontos como o direito à autodeterminação e a necessidade tanto de valorizar a estrutura tradicional de governança indígena quanto de promover o fortalecimento das organizações e associações indígenas.
Já a necessidade de ver reconhecidos os direitos territoriais indígenas foi um consenso entre os participantes dos três países. Este tema é recorrente na pauta das discussões dos Encontros Transfronteiriços e não poderia ser diferente, já que se trata de um direito fundamental dos povos indígenas, garantido constitucionalmente no Brasil mas que não é assegurado na Guiana Francesa nem no Suriname. Importante destacar as dificuldades enfrentadas pelos povos indígenas, sobretudo do Suriname devido à depreciação dos canais de diálogo com o governo e aos retrocessos na adoção de instrumentos legais que garantam o direito aos territórios tradicionalmente ocupados pelos povos indígenas.
Os desafios ligados à gestão dos territórios também foram intensamente debatidos. Além de problemas como escassez de recursos e impactos de atividades ilegais como o garimpo, também foram destacados os conflitos nas formas de uso e ocupação do território, principalmente aqueles associados às restrições impostas às comunidades com relação ao uso de recursos naturais utilizados para sua subsistência e às fragilidades dos mecanismos de fiscalização.
Outro assunto que mereceu destaque no Encontro refere-se à nova política de fronteira, que vem sendo implementada pela Police Aux Frontières (PAF) da Guiana Francesa, proibindo que membros dos povos Palikur, Galibi Marworno, Galibi kali´na, Karipuna e Wajãpi, atravessem a fronteira entre o Oiapoque (Brasil) e Saint Georges de l’Oyapock (Guiana Francesa) para visitar seus parentes que moram naquela cidade ou realizar transações comerciais. Esse endurecimento no controle da fronteira tem impedido que membros de famílias indígenas se encontrem, como sempre fizeram nessa região, independentemente dos limites nacionais, rompendo uma intensa rede de relações, trocas e intercâmbios e uma história de convivência em comum. O debate sobre essa questão motivou a elaboração de um documento, a Carta dos povos indígenas do Planalto das Guianas, aprovado na plenária final do Encontro, que será encaminhado para as autoridades do governo brasileiro e francês. O segundo documento, a Declaração conjunta sobre os direitos dos povos indígenas, trata da necessidade premente dos governos do Brasil, da Guiana Francesa e do Suriname, de reconhecer e, sobretudo, respeitar os direitos dos povos indígenas, principalmente os territoriais, conforme disposto e reconhecido pela comunidade internacional. Estes documentos serão difundidos e encaminhados às autoridades governamentais e à mídia dos três países para que medidas sejam adotadas no sentido de atender a estas demandas e, assim, respeitar os princípios reconhecidos internacionalmente como os dispostos na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho- OIT e na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.
Para celebrar o fechamento dos trabalhos e do Encontro, uma apresentação do Turé foi realizada por representantes dos Povos Indígenas do Oiapoque.
Desdobramentos – Um comitê com representantes do Brasil, da Guiana Francesa e do Suriname, que terá como função encaminhar as deliberações e propostas formuladas durante o Quarto Encontro Transfronteiriço está em processo de constituição. Caberá a seus membros preparar uma pauta de articulação de atividades para serem desenvolvidas ao longo do próximo ano e coordenar suas ações com as comissões nacionais, que deverão se encarregar da mobilização de atores e da divulgação das iniciativas de articulação no âmbito de cada país.
Uma exposição em banners intitulada “Articulação Transfronteiriça do Povos Indígenas do Brasil, Suriname e Guiana Francesa”, registrando os debates ocorridos até o momento entre os representantes indígenas destes três países, foi apresentada durante este Quarto Encontro e será, a partir de 2012, exposta no Museu Kuahí dos Povos Indígenas do Oiapoque.
O Encontro Transfronteiriço dos Povos Indígenas do Planalto das Guianas é uma iniciativa do Iepé, com apoio da Rainforest Foundation Noruega.