Teve prosseguimento hoje, dia 05 de novembro de 2014, a III Oficina Regional de Política Indigenista para Associações Indígenas do Amapá e norte do Pará. O evento teve início ontem, 04 de novembro, e prossegue até o dia 07 de novembro, no auditório do Hotel Macapá.
Na manhã desta 4ª. Feira, representantes indígenas envolvidos com o manejo de recursos naturais empreendidos na região, relataram suas experiências. O manejo de arumã para produção artesanal, a criação consorciada de animais silvestres e o plantio no cerrado foram os destaques das apresentações dos Wayana, Aparai, Wajãpi, Tiriyó e Kaxuyana. Estas iniciativas foram desenvolvidas no âmbito do Projeto “Apoiando experiências indígenas em gestão territorial e ambiental no Amapá e Norte do Pará”, desenvolvido pelo Iepé, a partir de chamada pública de apoio financeiro a projetos de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) em áreas indígenas, promovida pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). O objetivo geral deste projeto é promover e fortalecer experiências e práticas tradicionais de manejo e ocupação territorial e ambiental destes povos indígenas. O manejo do açaí foi a experiência relatada pelos representantes indígenas do Oiapoque, desenvolvida no âmbito de uma projeto em parceria com a Embrapa.
Arumã – Os Wayana e Aparai relataram a experiência com o manejo de arumã próximo as aldeias Bona, Xuixuimëne e Jolokoman, nas Terras Indígenas Parque do Tumucumaque e Rio Paru D’Este. Após uma viagem de intercâmbio ao Rio Negro, em 2010, em que puderam conhecer o trabalho de manejo realizado pelos Baniwa no Rio Içana, os Wayana e Aparai iniciaram o manejo de arumã, utilizando duas técnicas distintas, ambas exitosas em garantir essa importante matéria-prima com a qual confeccionam cestos dos mais diversos.
Roças – Aretina Tiriyó e Sebastião Kaxuyana relataram que também iniciaram o experimento de manejo de roças no cerrado após um intercâmbio ao Parque Indígena do Xingu, onde conheceram um modo diferente de cultivar mandioca e de plantar pequi. De volta ao Parque do Tumucumaque, aplicaram o que aprenderam na viagem. O Cacique Aretina relatou que “A maneira como eles plantam mandioca lá no Xingu dá certo, e é melhor do que a nossa maneira. Do jeito como plantam lá no Xingu, com uma cova só, você já enche o seu jamanxim de mandioca. E a semente (de pequi) que a gente trouxe de lá, plantamos e deu certo”.
Cotia – Os Wajãpi apresentaram os resultados de seu experimento com a criação consorciada de animais silvestres. No caso, a implantação de um criatório de cotia, na aldeia Aramirã. Puku Wajãpi falou sobre as dificuldades e os resultados que estão tendo com a criação de cotias.
Açaí – Por fim, os representantes indígenas do Oiapoque, Domingos Santa Rosa e José Damasceno Forte, relataram os resultados do projeto ABC Fruticultura, que vem sendo desenvolvido na região do Oiapoque, com assessoria da Embrapa, que visa a diversificação e melhoria no plantio de frutos cítricos e do açaí.
As apresentações dos representantes indígenas envolvidos geraram reflexões importantes sobre boas práticas de manejo de recursos naturais, como essa de Seki Wajãpi: “Quando a gente pensa coisas boas para o futuro, as coisas boas acontecem nesse futuro, mas se a gente não pensa coisa boa para o futuro, então não levamos coisas boas para o futuro”.
Panorama indigenista – Na parte da tarde, o antropólogo Ruben Caixeta falou sobre o ‘Panorama atual e perspectiva futura das políticas e dos direitos indígenas’, traçando um quadro bastante realista, em termos do novo cenário político que começa a se configurar após os resultados das últimas eleições. Considerando o descaso do governo federal com a causa indígena, sobretudo nos últimos dois anos, e a diminuição em 30% no orçamento da FUNAI no último ano, falou sobre as consequências disso para a situação de educação, saúde e proteção territorial dos povos indígenas no Brasil. Citou exemplos que atestam a falta de preocupação devida por parte do governo federal, chamando atenção de todos para o retrocesso nos processos de demarcação de TIs em decorrência da pressão de representantes do setor econômico, principalmente do agronegócio, do setor minerário e hidrelétrico. Nesse contexto, destacou que muitos direitos constitucionais vêm sendo colocados em cheque por representantes e defensores desses setores, como atestam os vários projetos de lei contrários aos direitos indígenas. Diante desse cenário tão adverso, destacou a importância da organização do movimento indígena e de sua articulação política com todos os parceiros da causa indígena que possam somar esforços para reverter tal correlação de forças tão negativa para os povos indígenas, fortalecendo uma agenda mais positiva em defesa do bem viver dos povos indígenas.
Protocolo de Consulta Prévia- Fechando o segundo dia da oficina, Jatuta e Makaratu Wajãpi apresentaram para as demais lideranças indígenas presentes na oficina o ‘Protocolo de Consulta Prévia do Povo Wajãpi’. Iniciativa por meio da qual os Wajãpi tomaram à frente em propor ao governo o modo correto como esperam ser consultados face a projetos e iniciativas que possam impactar seus modos de vida e seus direitos. Em sua apresentação, Makaratu Wajãpi falou que “Na cabeça dos não indígenas nós não somos capazes de produzir algumas coisas, mas nós podemos, somos inteligentes. Antes o pessoal da Funai e da Saúde faziam as propostas para a gente, agora nós que fazemos. Temos nosso Plano de Ação e o Governo precisa saber como tem que se relacionar com a gente. E esse documento é o modo como o governos podem nos perguntar sobre as coisas. Quem nos ajudou a fazer esse documento foi a RCA e o Iepé”.
Na fala de Jatuta Wajãpi: “O governo não pode esconder a ideia, os projetos que podem nos afetar. Ele tem que explicar, mostrar tudo do projeto, não pode mentir”. E Japu Wajãpi complementou: “A consulta é a nossa arma!”
Esta III Oficina Regional de Políticas Indigenistas é promovida pelo Iepé, com apoio da Funai, Fundação Moore, Embaixada da Noruega e Rainforest Foundation Noruega e Ministério do Desenvolvimento Agrário.