Texto: Maria Silveira
“O homem tem a tendência de acreditar que o desenvolvimento é uma máquina. Para a gente, o desenvolvimento é em conjunto com a natureza. Nós não somos maiores que ela, nem ela maior que nós. Somos iguais”, afirmou Joyce Anika, uma das jovens participantes.
Para fortalecer a participação indígena no debate sobre mudanças climáticas, jovens comunicadores indígenas do Oiapoque transformaram as reflexões dos seus povos em produções audiovisuais. Essa iniciativa ocorreu durante uma oficina sobre comunicação e mudanças climáticas, realizada entre os dias 18 e 22 de novembro no Centro de Formação Domingos Santa Rosa, em Oiapoque.
Quatro vídeos foram produzidos, abordando as mudanças climáticas de formas criativas. Desde animações e entrevistas até histórias narradas em línguas indígenas, as produções audiovisuais capturam as observações e vivências dos povos do Oiapoque sobre mudanças climáticas.
Com a Conferência do Clima (a COP30) se aproximando, esses trabalhos se tornam uma ferramenta valiosa para amplificar as vozes indígenas e mostrar que o enfrentamento da emergência climática passa pela valorização dos conhecimentos dos povos originários. Por isso, um dos materiais de pesquisa utilizados pelos comunicadores foi o livro “Marcadores do Tempo”, elaborado pelos Agamin, pesquisadores indígenas e agentes ambientais do Oiapoque.
O livro publicado em 2023 é resultado de um trabalho de pesquisa sobre as percepções e reflexões dos povos indígenas do Oiapoque sobre as transformações ambientais que estão ocorrendo em seus territórios e que podem estar associadas às mudanças climáticas.
Comunicadores indígenas
Mais do que aprender técnicas de produção, os comunicadores reforçaram a importância de espaços como esse para participação da juventude indígena. “Esse trabalho é muito importante. Me ajuda na faculdade, ajuda as comunidades, minhas lideranças e meus caciques”, destacou Mel Marworno.
O grupo de comunicadores, formado por representantes das etnias Karipuna, Galibi Kali’na, Galibi Marworno e Palikur, iniciou suas atividades em 2021 e, desde então, tem realizado diversas produções audiovisuais. A oficina mais recente contou com 14 participantes, incluindo membros veteranos e novos integrantes que tiveram seu primeiro contato com o audiovisual. Esses trabalhos foram incorporados à Rede Arawa, coletivo de comunicação dos jovens do Oiapoque, criado a partir das formações de comunicação.
Conheça as produções dos jovens comunicadores
Produzido por Elinaldo Henrique, Cleidson Forte, Edian Santos e Wilson Damasceno, o vídeo “Cosmologia dos Cupins” explora o comportamento do cupim, um pequeno inseto tradicionalmente visto como marcador do tempo para indicar o início do inverno amazônico, a época das chuvas na Amazônia. O conteúdo foi adaptado em formato de podcast, com cerca de 3 minutos, facilitando a acessibilidade e o compartilhamento via WhatsApp. Confira na playlist:
Com uma pegada diferente, o vídeo “Olhares sobre o Clima” traz os jovens indígenas Tiago Arukwayene e Lucas Monteiro discutindo sobre uma doença que pode estar relacionada as mudanças climáticas que atingiu as roças de mandioca da região e afeta a subsistência dos povos indígenas do Oiapoque. Para contextualizar a crise, eles utilizaram imagens de arquivo da Rede Arawa, criando uma linha do tempo que retrata os impactos na produção local.
E as Taocas Vermelhas? Você já ouviu falar? Joyce Anika, Mel Marworno, Sebastian Lod e Regiane Forte contam como essa espécie de formiga cortadeira é conhecida pelos povos indígenas do Oiapoque como um marcador do tempo que indica o verão. No vídeo “A Formiga que Sinaliza a Chegada do Verão”, eles usam animações, desenhos e áudios para explicar o comportamento dessa formiga e sua relação com as mudanças climáticas e os impactos no território. O vídeo é narrado em português, com uma pequena história na língua Kheuol Karipuna e legendas em português.
Para abordar o tema do aquecimento global, os jovens Denise Mirela, Ligiane Batista e Moisés Sedo produziram o vídeo “O que é aquecimento global?”. Nele, exploram conteúdos das teorias da ciência não indígena e as percepções das mudanças do clima e a partir dos conhecimentos indígenas. O vídeo é apresentado em português, Kheuol Karipuna e Parikwaki (do povo Palikur Arukwayene), com legendas em português para garantir acessibilidade. Esse vídeo estará disponível em breve.
Essa oficina fez parte do projeto “Projeto Amapá: Política de Mudanças Climáticas e Povos Indígenas”, uma iniciativa do Iepé com o apoio do Environmental Defense Fund (EDF), para fortalecer a participação indígena em políticas climáticas, trazendo sua voz e experiência para o centro do debate.