“Nossa luta é como um terçado que está sendo amolado”, afirma liderança em encontro de mulheres indígenas

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As mulheres indígenas Wayana e Aparai se reúnem anualmente para discutir e organizar projetos que fortaleçam sua luta.

Texto: Maria Silveira

Conselheiras locais das 28 aldeias das TIs Parque do Tumucumaque e Rio Paru D’Este nomeadas durante o Encontro. Imagem: Pedro Ribas / Iepé

A aldeia Bona, na Terra Indígena Parque do Tumucumaque, foi palco de um momento importante para as lideranças Wayana e Aparai que participaram do encontro anual da Articulação de Mulheres Indígenas Wayana e Aparai (AMIWA), realizado entre os dias 05 e 09 de agosto. O fortalecimento político da articulação foi um dos principais temas de discussão.

Desde sua fundação em 2017, a AMIWA vem reforçando, ano após ano, seu papel dentro da Associação dos Povos Indígenas Wayana e Aparai (APIWA), desenvolvendo projetos voltados para as mulheres, como a produção de pimenta e artesanato. As atividades, feitas sempre de forma colaborativa, beneficiam as mulheres indígenas da região que buscam autonomia financeira e social.

“O fortalecimento da AMIWA é um momento importante de reconhecimento da organização das mulheres dentro de uma associação comandada por homens, mostrando que elas podem ter autonomia para tocar os projetos que as beneficiam”, é​ o que comenta Sofia Galvão, assessora indigenista do Iepé. 

Fortalecimento Interno

Durante o encontro, as mulheres realizaram a leitura coletiva do regimento interno e discutiram questões centrais para a articulação, como a definição de 28 conselheiras locais, além de coordenadoras e secretárias, e a estruturação dos projetos que elas desejam desenvolver. 

A advogada e consultora Nefertiti Hass descreve como funciona o processo de desenvolvimento de projetos. Imagem: Sofia Galvão / Iepé

Cecília Awaeko Apalai, uma das lideranças, falou sobre os desafios enfrentados e destacou o trabalho que a AMIWA está construindo é alinhado às demandas das mulheres. “Temos que continuar lutando pelos nossos direitos, porque nossa luta é como um terçado que está sendo amolado”, disse.

O regimento em construção inclui diretrizes sobre a representação das mulheres indígenas em discussões de políticas públicas e projetos relacionados a saúde, educação e geração de renda. Cecília ainda ressaltou a importância de incluir a questão da violência contra as mulheres no regimento: “A AMIWA também fará essa discussão e vai denunciar as violações de direitos”​, disse.

Arte ancestral

Um dos destaques do encontro foi a apresentação dos wejus – tanga ou saia frontal feita de miçangas, tradicionais da região. Foi um momento alegre já que, dentre as mais jovens,  poucas sabiam confeccionar a peça e aprenderam com as mais velhas durante uma oficina realizada no último encontro, em 2023. Ao todo, 30 peças foram feitas com miçangas de diferentes tamanhos e linhas de algodão, utilizando os conhecimentos passados de geração em geração.

Para celebrar o início do Encontro, Mulheres Wayana e Aparai cantam e dançam em direção a Tukusipan, casa comunitária onde aconteceu a atividade. Imagem: Pedro Ribas /Iepé

Os grafismos utilizados na saia são inspirados nas cestarias confeccionadas pelos homens. Os desenhos estão ligados às histórias de seus antepassados, em especial à figura da lagarta sobrenatural, conhecida como Tulupere (em língua Wayana) ou Turupere (em língua Aparai).

Para Nejomi Tiriyó, é essencial repassar esses conhecimentos: “Estamos ficando velhas, e nossos filhos têm que aprender conosco para assumir nosso trabalho. Igual às jovens que aprendem na sala de aula, elas também precisam aprender conosco. Temos que nos juntar para lutar, sozinhas a gente não consegue. Temos que avançar com a força do coletivo”, reforçou a liderança. 

Exposição dos weju que foram confeccionados em uma oficina da Amiwa durante o Encontro de 2023. Imagem: Nonopohe Waiana

O próximo encontro da AMIWA está marcado para acontecer em 2025, com reuniões extraordinárias previstas ao longo do ano para acompanhar o desenvolvimento dos projetos e o fortalecimento da articulação.

* O encontro anual da Articulação de Mulheres Indígenas Wayana e Aparai (AMIWA) teve apoio da Fundação Rainforest da Noruega, por meio do Programa Economia da Floresta (Foreco) e da Nia Tero.

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