“Vou levar comigo essa experiência para a minha aldeia, o manejo
de arumã é muito útil e não é difícil de fazer e dá bons resultados. (Amiakaré Apalai).
Entre os dias 21 e 30 de abril, quatro representantes Wayana e Aparai, habitantes das Terras Indígenas Parque do Tumucumaque e Rio Paru D’Este, extremo norte do Pará, conheceram de perto experiências de uso sustentável desenvolvidas pelos Baniwa, cujas aldeias estão localizadas às margens do rio Içana, um importante afluente do rio Negro, no Amazonas. Participaram desta viagem os artesãos Amiakaré Apalai (chefe de posto da aldeia Bona), Apowaiko Apalai (Agente Indígena de Saúde da aldeia Bona), Jamae Wayana (professor da aldeia Jolokomã) e Jehje Wayana (cacique da aldeia Xuixuimene), além de Iori van Velthem Linke, assessor do Programa Tumucumaque do Iepé. Essa comitiva foi acompanhada e assessorada por Armindo Brazão, pesquisador Baniwa responsável pelos estudos de manejo de arumã; e por Adeilson Lopes, ecólogo do Instituto Socioambiental (ISA).
O objetivo deste intercâmbio foi oportunizar a troca de conhecimentos e percepções entre esses povos a respeito de experiências de manejo de recursos naturais, com especial foco no arumã, e que já vêm sendo desenvolvidas pelos povos integrantes da Organização Indígena da Bacia do Içana (OIBI) em parceira com o Instituto Socioambiental (ISA) há, pelo menos, 10 anos. O arumã (Ischnosiphon spp. Família Marantaceae) é uma planta de sub-bosque presente na região amazônica. De sua casca é extraída uma fibra muito resistente que é utilizada por muitos povos indígenas da Amazônia na manufatura de objetos trançados. Além do artesanato comercializável, que é uma importante fonte de renda, o arumã também é base para a produção de tipitis, cestos-cargueiros, peneira e abanos – objetos imprescindíveis para o beneficiamento de muitos alimentos de extrema importância. Sem o arumã seria virtualmente impossível para os Wayana e os Aparai, por exemplo, produzirem sua farinha, seu beiju, sua tapioca, seu tucupi e suas bebidas fermentadas de mandioca e de outros cultivares.
Contudo, já há algum tempo, os artesãos Wayana e Aparai – que, por sinal, são reconhecidos como excelentes trançadores de arumã – juntamente com o Iepé vêm constatando a crescente escassez desta planta nas proximidades de suas aldeias. Desta preocupação conjunta nasceu um projeto de manejo de arumã que faz parte do programa de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) indígena e é financiado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
A primeira etapa desse projeto é conhecer os povos que detém os conhecimentos sobre como manejar o arumã para que valiosas informações sejam trocadas e com isso, renovadas e revalorizadas também. Aí entra a experiência dos Baniwa com esse tipo de manejo. Tal como os Wayana e os Aparai, os Baniwa são muito hábeis na produção de seus belos trançados, e muito de sua produção de alimentos também depende do arumã. No passado, eles também se preocuparam com o rareamento do arumã, e por isso se mobilizaram e junto de seus parceiros procurou descobrir formas de uso e manejo desta planta para que nunca acabe. Os excelentes resultados foram publicados e ainda hoje servem de referências para muitos povos interessados em manejar esse importante recurso florestal.
A viagem de intercâmbio
“Vendo assim, na prática, a gente fica mais animado em voltar pras nossas aldeias
e repetir as experiências lá com o nosso povo” (Apowaiko Wayana Apalai).
Para tanto, os Wayana e os Aparai saíram de suas aldeias rumo à cidade de Macapá de onde viajaram para Belém e de lá para Manaus. Da capital amazonense outro avião foi pego em direção à cidade de São Gabriel da Cachoeira, região conhecida por Cabeça do Cachorro, de onde a viagem continuou em voadeiras até a parada final: a Escola Indígena Baniwa Coripaco (EIBEC) Pamaáli. Foi preciso três dias para que esses mais de três mil quilômetros fossem percorridos e povos dos extremos oriental e ocidental da Amazônia Brasileira se encontrassem.
Foto: Adeilson Lopes / ISA. (EIBEC Pama
Quando os viajantes chegaram à São Gabriel da Cachoeira , primeiramente foi feita uma visita à comunidade indígena de Itacoatiara-mirim. Neste lugar foi possível observar um extenso arumanzal (concentração de arumã) que tinha sido plantado há anos no local. Para os Wayana e os Aparai, trata-se de uma novidade incrível, nunca antes haviam presenciado a domesticação dar tão certo.
Foto: Apowaiko Apalai. (Maloca Comunitária de Itacoatiara-Mirim).
Em seguida, subiram o rio Negro até a foz do rio Içana, afluente em que estão localizadas as outras experiências de manejo de arumã que a equipe visitou. Já no médio rio Içana, na comunidade Santa Rosa, foi trocado mais conhecimento sobre outras técnicas de manejo de arumã, diferentes daquelas vistas em Itacoatiara-mirim. Por lá, também foi possível constatar a eficácia dos métodos que vem sendo desenvolvidos.
Os Wayana e os Aparai também visitaram a comunidade Tukumã-Rupitá, onde Armindo Frazão e Adeilson Lopes ministraram uma experiência prática de pesquisa de manejo de arumã.
Foto: Iori van Velthem Linke. Iepé
Na EIBEC Pamáali, onde a equipe permaneceu por três dias, muitas outras iniciativas em busca de técnicas de manejo, o uso sustentável e conservação da biodiversidade com aumento da qualidade de vida dos Baniwa e Coripaco foram apresentadas e muito atentamente absorvidas e refletidas.
Para a comitiva foi muito interessante ver como é possível encontrar formas alternativas de uso não somente do arumã, que é um exemplo, como também pensar sempre em sustentabilidade dos recursos naturais tão importantes para uma boa qualidade de vida.
“Eu gostei de ver o manejo de arumã dos parentes Baniwa do rio Içana na região
do rio Negro. A viagem foi muito longa, mas também foi muito boa, gostei da viagem.
Aprendi sobre manejo de arumã, piscicultura, viveiro de plantas e outras coisas mais.
Foi muito importante para nós conhecer outros lugares. Nós queremos que esse processo
aconteça cada vez mais, queremos viajar mais para outros lugares. Eu vou fazer
experimento de manejo de arumã na aldeia Jolokomã.” (Jamae Wayana)