Texto: Estefany Furtado e Marcelo Domingues
Entre 11 e 13 de setembro aconteceu a instalação da Rádio Comunitária da Aldeia Kumarumã, na terra indígena Uaçá, no Oiapoque. O projeto visa melhorar a infraestrutura de comunicação na Aldeia Kumarumã, que é a mais populosa da região, com mais de 2 mil indígenas.
Com a rádio comunitária serão divulgadas informações sobre temas variados, especialmente sobre medidas de prevenção à Covid-19 e combate à desinformação. O projeto foi elaborado pela Articulação Indígena do Povo Galibi Marworno (AIPGM) e submetido ao Fundo Socioambiental Casa, com apoio e assessoria do Instituto Iepé.
A obra para a montagem do espaço para a rádio começou com a limpeza e manutenção do antigo espaço da OI Telefonia na aldeia Kumarumã. Foi restabelecida a ligação elétrica e o maiuhi (como os indígenas chamam a limpeza do espaço) se deu com várias pessoas da comunidade, que também montaram os equipamentos.
A segunda etapa da obra consistiu na estruturação da rádio, com a ligação dos diferentes aparelhos conectados: computador, caixas de som, emissor FM, microfones e amplificador.
Em uma oficina, o professor e radialista Eduardo Margarit, da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP), falou sobre o funcionamento de uma rádio comunitária e orientou os moradores da aldeia Kumarumã sobre a dinâmica dos aparelhos radiofônicos.
O grupo que participou da oficina aprendeu também sobre a emissão de mensagens pelos microfones, transição de músicas, uso de conteúdo no celular para a rádio e a organização temática de um programa de rádio. Junto ao técnico responsável pela instalação, os indígenas entrevistaram outros membros da aldeia sobre o impacto positivo de uma rádio na comunidade.
“Esse grande projeto, que vem através da nossa associação AIPGM, vai ajudar muito a comunidade e vai chamar a atenção dos jovens, dos alunos e das lideranças. E por meio dessa rádio, vamos desenvolver o nosso trabalho, convidar o povo para fazer um trabalho, uma reunião, convidar os jovens para uma reunião, para o mutirão aqui na comunidade”, festejou Cristiano Florencio, cacique da aldeia Kumarumã.
Para Eduardo Margarit, a rádio comunitária é importante para o repasse de informações, principalmente em localidades mais afastadas, onde não se tem outra fonte de informação. “Eu acredito que hoje, mesmo com a popularização da internet e a facilidade de acesso aos smartphones, o rádio não perdeu espaço. Pelo contrário, as pesquisas mais recentes mostram que o rádio ganhou espaço com a pandemia. Muita gente precisou ficar em casa e passou a ouvir o rádio, que tem se reafirmado como um meio de comunicação importante na nossa sociedade”, disse Eduardo.
A Aldeia Kumarumã fica a mais de 50 quilômetros da cidade de Oiapoque, e nela há poucos canais de comunicação. Por isso, a rádio se tornou uma alternativa, trazendo informações da cidade para a população indígena. Atualmente, é muito difícil conseguir uma licença de operação de rádio, devido à burocracia existente no processo, que fica refém dos poucos editais de abertura para funcionamento, mesmo se tratando de uma rádio comunitária.
Junto à capacitação dos indígenas, foi definida uma planilha de transmissão e programação da rádio. Diferentes temáticas serão abordadas no dia a dia: religião, cultura Galibi Marworno, esportes, notícias da aldeia e de Oiapoque, avisos à população das reuniões comunitárias, entre outros.
Um dos objetivos do projeto da Rádio Comunitária de Kumarumã é incluir os jovens nas atividades para que se tenha a sensação de pertencimento ao local, além de dar visibilidade para a juventude, que muitas vezes não tem direito a fala dentro da comunidade.
Para Mel Marworno, jovem comunicadora de Kumarumã, a rádio é muito importante para melhorar a comunicação na aldeia. “É interessante a gente receber a rádio aqui para fazer a comunicação do que a gente tem, dos trabalhos comunitários como a limpeza e as reuniões que acontecem aqui na comunidade. Eu estou gostando muito de estar participando, disse Mel.
A proposta é criar uma grade de programas cada vez mais dinâmica, aprofundando temáticas do contexto indígena, como a saúde. Para isso, os enfermeiros e Agentes Indígenas de Saúde (AIS) terão horários para falar na programação. Os professores indígenas também pretendem levar os assuntos das salas de aula para a rádio e, dessa forma, fazer com que haja mais disseminação das informações para além do ambiente escolar.
“Com o meu programa divulgarei a importância da cultura para nós, vou falar também sobre a universidade, pois muitos alunos fazem processo seletivo, chegam lá e reprovam porque não têm conhecimento sobre seu povo, as lideranças e o histórico da comunidade”, afirmou o professor Milton Nunes, integrante do Coletivo de Artista Waçá’wara.
Oscar Miranda, antigo coordenador da AIPGM e idealizador do projeto, falou que a rádio irá contribuir no combate às fake news. “Isso evitará a disseminação de informações falsas, além de valorizar nossa força cultural, promover o fortalecimento interno da organização e envolver os jovens na execução e trabalhos comunitários”, disse.
A AIPGM, que atualmente está em fase de regularização como associação, pretende submeter mais projetos voltados para o povo Galibi Marworno e demais etnias da região. Esse é o primeiro projeto de grande porte desenvolvido pela comunidade e espera-se que tenham mais alternativas para levar a comunicação para dentro das aldeias indígenas do Oiapoque.
“A comunidade vem crescendo e não tinha como a gente reunir todos para repassar mensagens e informações. Aí foi pensado o projeto da rádio, para facilitar a comunicação das pessoas, sem que as pessoas saíssem das suas casas. A rádio vai facilitar o diálogo na comunidade e o trabalho da AIPGM”, celebrou Rubmauro Marcial, atual coordenador da AIPGM.